quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

Trap (Ambush Part II)

  A luz trêmula passava apressada por entre os liames do beco, como que tentando fugir das garras do escuro. O álcool exalado com o suor dela invadia suas narinas de maneira irritante, junto com o cigarro, a urina, e todo o resto da sujeira que jazia naquela viela negra. O barulho desconcertante dos braços dela se misturava aos risos escandalosos, e culminavam numa sinfonia dissonante que começavam a tirar-lhe a calma. Estava na verdade, irritado com tudo aquilo; Os sons, os cheiros, a visão imunda daquele ambiente...Tudo que ele sentia era fúria, raiva, e sangue borbulhante. Era; naquele momento, um punhado oscilante de dentes rangendo e músculos retesados, esperando um alvo para cravar as presas e descarregar tudo o que tinha (pobre dela)
  A mão trôpega guiava-o para longe da luz trouxe-o de volta de volta da sua viagem interna sobre seus ódios e mazelas, apenas para aguçá-los(mais um prego no caixão). Ele no entanto, se refreava. As bocas e mãos começam a explorar os caminhos dos corpos em meio à escuridão fria da madrugada. a fricção das roupas contrastavam com a luta interna que se travava nele. Suas bestas internas rasgavam-se pelo direito de ditar-lhe o que fazer.
  Uma parte de si ansiava por aquilo. Ele tinha fome de carne. De calor. de toque. E apesar do desconforto de tantos sentidos, aprazia-lhe (ainda que momentaneamente) ter aquele ser entre as pernas, a matar-lhe as vontades. O gosto do sangue, e suor e álcool inundavam-lhe a boca e o pensamento aquela noite, e era por aquilo que ela tinha saído aquela noite. Era pela carne, e o gozo, e a lascívia, e a lástima que sentia do íntimo de seu corpo. E era apenas por aquilo, que as outras feras ainda se mantinham em suas coleiras.
   Ele sentiu a fera e a fome adormecerem junto com o torpor do corpo satisfeitos com os desejos primários. Inundados com o gozo recente. Agora, vinha a diversão. As feras dentro de si começavam a acordar, e sussurrar-lhe ao ouvido.Subitamente, os sentidos começaram a voltar-lhe. Ele força um sorriso para ela, que responde igualmente, com um olhar entorpecido de dopamina e cachaça fluindo pelo sangue. E é disso que ele começa a sentir sede. Sangue. A fúria bate à porta, e ele se vê com vontade de acabar com aquilo ali mesmo. Rasgá-la de cima a baixo. retalhá-la tanto quanto podia. quebrar osso. talhar carne. cortar tendão. Ver o sangue correndo rubro pela sarjeta seca.
   Ele queria Tudo. Tudo de uma vez, para que pudesse acabar com tudo. Queria apenas o fim. O dele, o desse ódio que o consumia, que consumia tudo e todos. O fim desse mundo incômodo que era tão estranho aos seus aguçados sentidos, Queria que tudo acabasse ali. Mas já que não era possível, talvez acabar apenas com ela já fosse um começo...
   Entrou em ação algo mais profundo. Mais intrínseco. Mais cruel. A vontade do caçador impelia-o a acalmar-se. A se segurar. A esperar pelo momento certo. "Nunca volte de mãos vazias". As mãos começaram a acomodar-se pelo corpo dela, que despercebidamente, deixava-se envolver. Mãos, pernas, braços. Todos os membros iam lentamente posicionando-se para a ação final. O rush acontecera como de costume. Ela notara o que acontecia quando era tarde demais(pobre presa indefesa). " Pavor em si, não é um estado estático, mas um estado dinâmico. É quando a alegria desmancha-se em desespero". Ele deleitava-se com as fúteis tentativas da presa de se libertar. O medo inundando os seus olhos...
-Oh, Glorioso! pensou ele. Era esse momento, que fazia tudo valera a pena. O resto, era resto.
Ele apreciou os esforços dela por um último momento, e deu o puxão brusco no pescoço que fez a vida deixar aquele corpo. o estalo das vértebras se partindo veio acompanhado do estado de moleza sacudinte do cadáver que agora ali jazia.
  Ele pousou o corpo sentado gentilmente junto à parede do beco, e caminhou até a rua principal.

                                                                                               A noite estava apenas começando...

BlackHeart


   -Sua fraqueza custou as vidas deles naquele campo! morreram todos, e para quê ?
perguntou o velho. As palavras saíam grossas e amargas, testando toda a paciência que eu tinha aos dezesseis anos de idade...
-Era um exercício apenas !Ninguém morreu! Estávamos encurralados! que podia eu fazer ?
Gritei. Os olhos negros do velho caíram sobre mim, pesados como uma bola de chumbo. Senti vergonha,baixei a cabeça. O que ele falou em seguida, eu mantenho comigo ainda hoje...
 -Eu digo a vocês agora: É no coração e na mente dos homens que todas as batalhas são travadas e vencidas. Das pequenas às grandes coisas, É no encontrar dos olhos, e das almas, que tudo acontece e se decide.Não apenas no campo de batalha, mas em tudo que fazemos. Nós lutamos para vir a este mundo,  e lutamos até o momento em que o deixamos. A vida é uma batalha, e as pessoas interagem lutando! Então, da próxima vez que te empregardes em algo, por menor que seja, lembrai de dar tudo de vós, pois Enquanto puderes lutar, ainda podes vencer!

   -Como poderia haver vitória? fomos sobrepujados! Os olhos dele voltaram-se novamente para mim.
-O que é vitória? perguntou-me.
-É sobrepujar o oponente. respondi.
-Olha para mim, e responde: O que é ser sobrepujado ? pensei na pergunta, baixei novamente a cabeça.
-Num campo de batalha, podem tirar-lhes o cavalo, a espada, a couraça, os membros, e até mesmo a vida. Mas a vitória não é algo que podem tirar de vós. A vitória é algo que é concedido. Vencer um homem verdadeiramente, significa enfrentar a sua vontade, e despedaçá-la! é dobrar a alma dele diante da tua ! é quebrar seu espírito! Vocês perderam de fato naquela colina, porque Diante do inimigo, vocês vacilaram.
-Entendam;vencer,é sustentar-se diante da maré. é permanecer de pé dia após dia contra todas as batalhas que a vida vos dá. Usem isso como escudo, e jamais serão derrotados. Sede vós como o aço sob o martelo! que não se quebra, mas se purifica a cada pancada. Refinem suas vontades com as pequenas tarefas, e terão força diante das grandes! Fazei isso diariamente, e mesmo que percam, jamais serão derrotados!
  -Encontrarás algo dentro de ti que ninguém jamais poderá tirar. Algo que vai além desta máquina pulsante que nos serve de receptáculo. Porque vocês se darão conta de que não são esta rude matéria, mas seres de luz imutável.Se encontrarão sozinhos e em frente a vós rugirão raivosamente cinco mil soldados. Cairão mil à esquerda, dez mil à direita, e vocês não serão derrotados. Eles tentarão mais não vão conseguir dobrar a vós, POQUE ELES NÃO TERÃO PODER!

  Foi a partir deste momento, a partir destas palavras, que eu senti algo mudar em mim. Foi quando eu comecei a enxergar as coisas de uma maneira diferente. As palavras do velho ecoaram em mim de uma maneira que eu não conseguia explicar naquela época...Eu olhava para ele, e já não via mais o velho curvado que me atormentava com lições irritantes.EU VIA UM GIGANTE! Eu via um bastião diante do qual haviam-se quebrado milhares de guerreiros, Tal qual as ondas do mar quebram-se diante das falésias. Eu via um espírito inquebrável que transcendia os limites do corpo que habitava...

                                                                    Eu via aquilo que eu desejava me tornar algum dia.