segunda-feira, 26 de outubro de 2015

Cordel

  OS olhos. Tudo começa pelos olhos. O choque de dois pares se sóis, a contemplar-se. Plenos castanhos espelhados um no outro, a bailarem na transmissão de pensamentos. Mergulhar entre os poços tintos e profundos, que nos tragam fundo adentro. E sentir o calor e vividez pulsante, que silenciosamente nos grita: vem.
  E puxar, e empurrar. E ser puxado e empurrado. E pressionar, e ser pressionado. E ver, tocar, ouvir, cheirar, sentir. E ser visto, e tocado, e ouvido, e cheirado. Ser sentido. E ser tudo rubro. E róseo. E cóbreo. E tinto. Dançar pelas paredes, e sentir a alma através da carne. Soltar as mãos, e atravessar as camadas. As vestes. O pelo. A pele. A carne. Cravar as unhas e sentir o rubro ocre correr pelas garras. Pelos dedos, pelas costas, Pela língua. E aspirar o ar lotado de sussurros e gemidos, e aquecer-se entre a pele pálida, mas ainda assim tão cálida. E já nem saber mais o que se é e o que não.



   Deitar-se para o lado. Na ausência lânguida de movimento, entorpecidos. Olhar os olhos, cansados. E entregar-se ao abraço lento. E ao ditar do respirar profundo. Sentir os olhos, que se olham; mesmo sob as pálpebras fechadas. E as almas, que se agarram, por medo de se desgarrar, enquanto os corpos, exauridos e mal acabados, jazem largados, na imensidão do quarto vazio. Ouvir o som. Do ar pesado, entrando arrastado, pelo nariz arrebitado, do rosto de cada um.

Cair no sono. Para sonhar acordado, sentir-se extasiado. Por que se ama, e se é amado. Por esta que está ao meu lado, com desejo sentimento e vontade. Segue o amor entalhado, no coração de cada um.