Assim que a porta do porão se fechou e seus olhos começaram a se acostumar com a súbita escuridão que os invadira, ele a viu. Pouco mais de dois metros à sua frente, Misha estava sentada em uma velha cadeira de balanço, enquanto observava um antigo e desbotado livro de figuras. Suas mãos pequenas e magras, folheavam delicadamente as páginas sob a luz de um toco de vela. Ela estava descalça. Usava um vestido que aparentava, um dia, ter sido azul, e um chale branco que cobria sua cabeça deixando escapar alguns cachos; que eram tão negros quanto seus grandes olhos.
Ela levantou seu rosto pálido e lançou-lhe um olhar curioso, porém levemente amedrontado. Sem desviar os olhos, ela fechou o livro e o pôs de lado na cadeira, para depois levantar-se, e lentamente, ir em sua direção.A tensão e a desconfiança evidentes nos olhos daquela criança eram algo que ele imaginava encontrar. Mas a compreensão que Misha apresentava da situação era uma surpresa para ele. Misha estendeu a mão e pegou um dos biscoitos do prato. Apesar da fome que ele sabia que a afligia, ele a viu murmurar uma pequena oração em agradecimento ao alimento, e pôr-se a mastigar o biscoito vagarosamente, enquanto esboçava um tímido sorriso de gratidão.
A visão daquela garota fraca, suja e desnutrida; escondida naquele porão igualmente miserável, o fez pensar no quanto essa guerra era realmente errada. Em quantas atrocidades podiam ser realizadas devido a meros caprichos de um mal homem com uma boa patente, e em como em um mesmo país podiam haver tantas mentes fracas a ponto de se deixarem acreditar que aquela criança era um mal que devia ser expurgado.
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