sábado, 17 de novembro de 2012

"E eis que o homem, é por definição..."

...Incompleto. "Pois o homem nasceu com um vazio no coração. Um vazio que nenhuma posse, poder ou conhecimento pode preencher." É isso que o faz sempre triste, e é isso que o faz querer sempre(algo a) mais.É o vazio. Mas não se trata do vazio. se trata do que não é. Que é aquilo lhe falta. E pelo lhe falta, quer tudo que se há para ter, e tem tudo que há para querer, menos aquilo que realmente precisa.O que o preencheria de verdade. E tentando sair do vazio, acaba voltando para ele, mesmo sem perceber. De dentro para fora, e de volta para dentro. Passa a vida procurando o que nunca tinha perdido, mas que no fim das contas, perdeu; por que procurou a vida inteira.
E na falta disto que perdemos, vamos tentando nos preencher com aquilo que achamos pelo caminho. coisas que nem cumprem esta função, e que nos cegam para aquilo que achávamos faltar, mas que estava lá o tempo todo. Só que éramos cegos, e não percebíamos que estava.
 ....E sempre tentamos preencher este vazio, mas  nos recusamos a reconhecer que é o vazio que nos preenche, e que não importa o que façamos, ou com o que o enchamos, ele continua a não ser outra coisa, senão vazio.
...Falamos que o sentimento vem do coração, mas é na boca do estômago(ali, dois dedinhos abaixo da junção as costelas) que sentimos o buraco negro da tristeza e da ansiedade, o explodir cósmico do gozo e da alegria, e a nebulosa ácida da raiva e do medo. A alma do homem não habita dentro dele, e sim fora. Por dentro, temos um fragmento do universo no qual nos encontramos contidos.E que em sua maior parte, não é outra coisa, senão vazio. Quando aceitarmos isso, quando aprendermos a olhar para dentro de nós, ao invés de desesperadamente procurar pelo que há por fora, não teremos mais um vazio. Pois nós seremos o vazio. não seremos mais a parte, e sim o todo. E voltaremos em paz para o vazio de onde fomos uma fez gerados, e que por medo que temos(pobres crianças), fomos separados.


      ...Escrito no meu caderno de cálculo 1, numa noite à qual eu não tenho lembrança alguma, além de acordar no meio da noite totalmente sem sono, escrever e voltar a dormir.

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Drops


    O céu rasga. As cortinas abrem-se. O pai derrama seu pranto fecundo na crosta estéril e inutilizada. O palco se arma.As gotas descem. Um exército de pequenas cantantes que se espalha por tetos, calhas e afins.Olho pra o céu. Bailarinas cristalinas dançam, beijam minha face,acariciam minhas roupas gota a gota.  Tantos tons na mesma nuvem cinza, tanta vida numa cor apenas. Muito mais cor que o cinza dos prédios e calcadas.Olho à minha volta. Passos lamacentos divagam pela rua. Escondem-se em seus guarda-chuvas. Olhos no lixo, anestesiados demais, perdidos em seus próprios mu(n)dos-pensamentos. Atrasados e apertados uns contra os outros, fecham os olhos para a beleza que os cerca.


      Chove.



domingo, 30 de setembro de 2012

Oblivion

    Sempre fui um homem de muitas manias. Isso é fato. Algumas mais graves, outras mais serenas, algumas às quais eu teimo (tenho a mania) em achar uma certa simpatia, tal qual a uma criança que faz arte e a gente não consegue dar bronca, por ele ser "assim mesmo". Algumas manias minhas, eu comecei pegando emprestadas de outros e outras, que por tamanha afinidade, vão deixando um pedaço deles com a gente,e levando um pedaço da gente com eles, e no fim, você nem sabe mais o que é seu e o que não é.Pois que no final acaba sendo tudo seu mesmo. Uma das que eu gosto mais, é a mania de sorrir e tempo integral. Dessa, eu me orgulho muito, e exponho no centro da minha estante.Muito minha, desde sempre.Me perguntaram uma vez, qual o motivo de "sorrir pra todo mundo".Eu perdoei o pobre coitado, ele não entendia, eu não sorrio pra todo mundo. eu sorrio pra mim mesmo. Você só pega o reflexo disso.
    Deixando agora as boas de lado, uma que me zanga muito, é essa de esquecer, e não esquecer. Fonte de muitos males meus. Lembro dos que me esquecem.Lembro-me de coisas que daria tudo pra enterrar. Lembro-me como se fosse hoje,como se fosse agora, como se fosse. E o que deveria lembrar eu esqueço. E isso dói. Dói porque esqueço o que( e quem) sempre se lembra pra mim, e dói também neles, e dói mais ainda em mim, por saber que que doeu neles, e que eu fui a causa dessa dor. Esqueço daquilo que urge, e faço o que tem folga. Esqueço de cuidar de mim, e cuido dos outros. Esqueço de cuidar do outros, e não cuido de ninguém,e as vezes esqueço de não cuidar de ninguém, e vou dar pitaco na vida dos outros.
    Não bastava terem aparecido os problemas. Eu os alimentei, e levei pra passear, e agora fico reclamando quando eles me mordem. Bem, minha mania de reclamar não é uma das minhas favoritas, mas infelizmente  é minha.E muito minha, diga-se de passagem.Tenho que lembrar de qualquer hora dessas, fazer uma limpeza na minha estante de manias. Ver o que tem pra jogar fora, e o que dá pra deixar no lugar. E a quem quiser uma mania nova, pode vir falar comigo. Qualquer coisa a gente troca, se você tiver um hábito que for do meu agrado.

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

A frágil espécie

   Carrego comigo a essência das feras, um perfume entranhado, uma seiva, e por vezes, me atiro sobre a presa. Eis o crime, a fúria, o atrevimento. O lobo em mim, a hora do desespero, a violenta necessidade de sobrevivência que irmana toda a criação. Sou um mamífero de rapina: garra, dente, e bote. Mas não trago a identidade verdadeira da arribação, e não me é fácil deixa o campo de caça, a quadra onde sei viver. Dito de outro modo, não corto os laços com o covil. Se é imperioso viajar, lanço mão de mochilas grandes, com muitas roupas e livros, postiça sensação de que levo a toca junto. Mais do que tudo, não deixo o sotaque original, testemunho e garantia de vir de um lugar, ser cria do meu rincão, e não de qualquer outro. Claro que vejo as outras coisas, tenho curiosidades, convivo com diferenças, e tudo isso é nada, porque força alguma arranca a raiz se ela é profunda, a base é sólida e o chão nativo é uma certeza. Assim, não dou beira a frivolidades, maquiagens, e novidadeirices: quero saber de força e firmeza, amparo e afeto, valor e verdade. Amenidades não saciam a ânsia que a custo refreamos. Está certo que chegamos até aqui, criamos o verniz, a capa de polidez, o bom-tom. Além disso, os anciãos da tribo afirmam que o hábito é uma segunda natureza. Pode ser. Pode até ser: os costumes civilizados fazem a existência possível e confortável. Mas nos mais genuínos dos nossos o adestramento não consegue ser perfeito e, firme na espreita, o bicho faminto guarda na língua a sabedoria dos nutrientes inequívocos. E vamos dizer de uma vez que os baixos teores são desprezíveis pra quem vive de abocanhar carne e sangue e, debaixo de véus de elegância, preserva o paladar selvagem. Se é assim, na destreza da camuflagem vai a certeza de que a linhagem não degenera.



                       Liturgia do sangue-ReNato Bittencourt Gomes

sábado, 1 de setembro de 2012

Anima Sola


   Ali, aguardando para ser apontada julgada e condenada purgando em dúvida seus pecados ardendo, mas nunca consumida, a alma solitária, mesmo em meio à multidão, vaga pela cidade que pulsa caoticamente em cada um de seus pavimentos cinzentos, vagueia com suas botas de solas esburacadas de tanto seguir rumo a lugar nenhum, passa pela juventude que entoa seus hinos monotônicos da geração dessa semana, com seus cabelos iguais e celulares de última geração. Vagueia e vê as pessoas que passam e a abandonam e se abandonam aos poucos em parcelas do seu cartão de crédito de limite estourado pelos vestidos de festa, da festa que acabou com a cinderela de ideais estuprados, maquiagem borrada e pés doloridos em sapatos que não eram de cristal, deixam cacos para trás para se tornar um, para caber na forma, espremem-se torcem-se para entrar no molde de metal para não lidar com os cacos de si, cacos que cortam e deixam escapar o sangue rubro , talvez não sangrem, afinal sangrar é tão demodê. Passam apressados e apáticos à brisa com cheiro de mar a beija no rosto e bagunça os cabelos, não sentem não veem. São partículas que dão à cidade maquinal e cinza a impressão de pulsar, mas não pulsam mais. Os velhos não têm mais olhos sábios, o jovem não tem os rostos rosados e cabelo desfeito pelo deliberado desleixo. Os adultos não são mais heróis e talvez nem às crianças seja permitida a inocência. Tudo pulsa, mas nenhum coração bate. É um pistão metálico que impulsiona pra frente, e quem tem tempo para pulsar? E no desespero desse mundo monocromático grita alto até a garganta sangrar e os pulmões estourarem. Violenta também o paraíso sensorial do seu ego sem aguentar a solidão que lá havia. Talvez o som do grito da dor irrompesse as barreiras do mundo bom que só ela conhecia. Julgam-na como louca, pecadora profana, sem saber que cometem todos os dias o crime de tentar ser normal.


Extraído do blog PROFANO... INTRÍNSECO... ORGÂNICO... em um dia de chuva interna e extrena. 
O sol brilha, mas a genialidade do texto ficou na minha cabeça.

terça-feira, 7 de agosto de 2012

Rider

O olhar. Sim. Tudo começa com os olhos (aqueles grandes e castanhos que mal cabem nas órbitas). E o apreciar. As pernas fortes, as ancas largas. O porte austero. Logo depois, vem (vêem) o primeiro contato. Monta. O passo curto, para encontrar o ritmo. E o som da fricção enche-nos os ouvidos. O som do couro raspando no couro, na calça, no pelo , na pele , no corpo. Músculos.  Pernas fortes. A força cresce. E sobe, e desce, e vai, mas não vem. Só vai. Pra frente, pra frente.PRA FRENTE!  Não mais o som da fricção. O ritmo foi dado. Ambos agora correm juntos. Colados, transpiram,respiram, resfolegam. E essa dupla resfolegação que enche o ar, cansaço compartilhado. Suor salgado, que tem a sensação de ser doce. As pernas doem. Difícil pensar que chegamos tão longe. Que se está indo tão rápido, rápido. RÁPIDO! A bomba pulsa, o sangue voa. Vai explodir. Não. Vai! Oh não, ah vai! Ainda não! Agora Sim!Agora! Segundos da mais pura sensação de liberdade. Slow-mo em tudo aquilo que existe, enquanto Eolos lambe-me a face. Suor, e calor, e torpor. E besta e homem, e homem e animal (e homem-animal) pulsam como se um apenas fosse. E acabou-se a corrida.

quinta-feira, 21 de junho de 2012

La Barbe-Bleue

    Acabo de ler um conto de “O quarto do barba azul”, de Angela Carter. Penso. Reflito. E tenho para mim, que deveria aprender francês. Por nada, mas por tudo. Pego por mim pensando em recitar o conto com toda a intensidade que senti quando o li. Descubro uma sonoridade de instrumento que me falta. Não que minha língua mãe seja desprovida de seus calores, como uns bons escritores bem o provam, mas certas intensidades demandam certas curvas no falar, certos bicos, certas feitas. Que nossas palavras não têm como encarnar. Não sou dado a dom-juanismos, mas devo admitir; Tantos encantos, tantas belezas. Uma língua menina, feminina como nenhuma outra. Penso no conto. Que me conta de beleza e intensidade. A bela que se animaliza. Mesmo linda; no instrumento-português, soa áspera. Língua de gato, cinza de borralho. No Frances, seria outra coisa. A urgência do falar, o arfar do ar, a entrecortar com as palavras. Dançam bolero por entre os meus ouvidos, ao som de Audrey Tautou. Palavras com cheiro de maçãs, (róseas) romãs, a ressoar de sensualidade. Está ai; a palavra que definiria. Sensual, Eros. hermosso vestido cobre as vergonhas das palavras.e finos pudores d’uma névoa de perfumes enevoam-se em minhas fantasias. O conto acaba. Mas minha mente não. Dilacera-se(me) em um ninho de  perguntas que já não tardam a serem respondidas. Paro por aqui. vou para o meu mundo, pensar e me perder em um conto e um sorriso,até que não haja mais sono para eu tragar, e que tenha que acordar para Este mundo novamente.

domingo, 13 de maio de 2012

call

Racho de dentro pra fora, e os trincos trincam e desabam sobre mim. sangro pelos olhos e as estrelas morrem dentro do meu estômago.tenho frio;e não tenho mais nada.Agora; eu queria que o telefone tocasse,pra ela me chamar de surdo,mas não vai mais tocar. Por favor, não me peça para matar você. Por favor, não me peça para quebrar o melhor elo que eu já tive. De que vale a liberdade para me encontrar se o preço é matar a parte do que eu já sou ? por hoje, volto a ser criança, e choro a dor por deixar que isto vá embora.


Eu queria que as coisas fossem mais simples.


Um dia serão. e quando forem, vou consertar você em mim de novo.

domingo, 29 de abril de 2012

pode-se ver que eles estão sorrindo; apesar dos borrões e das futuras intempéries.

domingo, 15 de abril de 2012

hunt

olhos arseníacos. verdes que envenenam, que enebriam e que apaixonam. espirais de um sol, cuja gravidade me arrasta para o centro. me perfuram como disparos de metralha. balas de chumbo cianídrico  me desnudam e expõem a minha alma-psiquê.
luto para manter a mente no lugar. para que os olhos de serpente nao me tirem o meu chão, para nao morder as maçãs do rosto que emoldura esses sóis de esmeralda.
os dentes no meu pescoço espirram-me o sangue, a saliva, e os trejeitos por lados e paredes. os lábios manchados de vermelho me lambem o ouvido.a língua silva o meu cabelo, e me escorre pela nuca, caindo pela coluna junto com o arrepio do aço contra-pele.
hoje, peço desculpas ao meu eu. pois hoje, nós,somos eu e ela. e eu vou queimar a língua com h2sO4

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

O todo sem a parte não é todo

O todo sem a parte não é todo,
A parte sem o todo não é parte,
Mas se a parte o faz todo, sendo parte,
Não se diga, que é parte, sendo todo.

Em todo o sacramento está Deus todo,
e todo assiste inteiro em qualquer parte,
E feito em partes todo em toda parte,
Em qualquer parte sempre fica o todo.

O braço de Jesus não seja parte,
Pois que feito Jesus em partes todo,
Assiste cada parte em sua parte.

Não se sabendo parte deste todo,
Um braço, que lhe acharam, sendo parte,
Nos disse as partes todas deste todo.


Gregório de Matos- Os homens Bons.